A questão é difícil mas não é com slogans nem clichés que a encaramos melhor, e ainda menos que lhe possamos responder de maneira positiva.
Desde que feneceu o movimento de emancipação social dos trabalhadores, as esquerdas políticas contemporâneas abraçaram várias “novas causas”. Por exemplo, a partir de princípios de direitos humanos geralmente aceites sem objecções no mundo de hoje como são a liberdade de circulação das pessoas e a “não-discriminação”, arvoraram-se em defensores da aceitação sem restrições dos fluxos de imigração provenientes de regiões mais pobres, e da extensão unilateral de toda a sorte de direitos nacionais a essas pessoas, ao mesmo tempo que as incentivavam a cuidar orgulhosamente das suas identidades culturais de origem.
Recusando também as políticas ditas de integração (isto é, de aceitação das principais regras de convivência social vigentes num país), acabaram por alimentar a subsistência e desenvolvimento de quase-ghetos sócio-culturais, reprodutores de pobreza e exclusão, e favorecedores de marginalidade e delinquência. Então, as ideologias e forças políticas de extrema-direita, nacionalistas e xenófobas, agradeceram a oferta, exploraram o filão securitário e mesmo racista, e acabaram por construir nos últimos quarenta anos algumas sólidas posições nos espectros partidários de várias nações democráticas da Europa. Um processo lamentável que deveria fazer reflectir as melhores cabeças da esquerda.
É provavelmente verdade que as miscigenações populacionais vão tendendo, no longo prazo, para uma maior integração e uniformização de toda a humanidade. A actual globalização económica e comunicacional está já a actuar fortemente nesse sentido. Mas essa universalização da “raça humana” – em si, uma boa coisa, um belo milagre, que apaga a maldição bíblica da Babel – tem de poder coexistir com a “sócio-diversidade” (neologismo que os bem-pensantes deveriam adorar), que não se consegue em tecidos urbanos desestruturados e sem alma. Ao lado das diversidades linguísticas, religiosas e outras, as culturas nacionais têm também o seu papel próprio de estruturadores das respectivas formações sociais, que não podem ser ignoradas ou sistematicamente espezinhadas. A sociedade global está sendo construída, mas isso exige tempos alongados e formas graduais de progressão, sob pena de poderem produzir choques violentos, enquistamentos e retrocessos. Não precipitemos aquilo que pode ser um futuro mais interessante.
JF/8.Mar.2011
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