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sexta-feira, 12 de agosto de 2011

E por onde anda a Islândia?

São menos de 400 mil os habitantes da Islândia, uma “terra de gelo” e vulcões onde os vikings terão chegado em 800 e tantos DC, e se criou um parlamento logo no séc. X mas que, tendo estado quase sempre integrada nos reinos nórdicos, só conheceu a sua independência em 1944, com um regime político republicano democrático. Os islandeses falam uma língua germânica próxima do norueguês antigo e são predominantemente cristãos luteranos.
Também muito integrada, escolarizada, participativa e liberal nos costumes, a sociedade islandesa é vista por alguns, a par da Suíça (e mesmo da monárquica Noruega!), como o melhor exemplo concreto de “social-libertarismo” actualmente existente (ver www.anarchy.no). E o país prescindiu praticamente das despesas com a defesa nacional, diplomaticamente assegurada por um sistema de alianças externas (Estados Unidos e NATO) que vem dos tempos da segunda guerra mundial.
A crise financeira americana de 2008 atingiu em cheio a população deste pequeno país que exibia índices de riqueza e bem-estar dos mais elevados do mundo: os níveis de consumo, a protecção social semelhante à proporcionada pela social-democracia nórdica e o endividamento privado tinham crescido mais do que deviam. A economia produtiva, tradicionalmente quase só limitada às pescas, alargara-se para alguma indústria moderna, turismo e novos serviços terciários e financeiros, muito abertos às trocas externas.
De repente, os títulos bancários passaram a nada valer e grande parte dos aforradores viu evaporarem-se as suas poupanças ou investimentos bolsistas, ao mesmo tempo que as falências bancárias arrastaram grave recessão da actividade económica, desemprego e punham em causa as contas públicas. A Islândia teve então de recorrer a um empréstimo do FMI.
A revolta popular foi pacífica mas expressiva e transmitiu-se imediatamente ao sistema político, levando à demissão do governo em Janeiro de 2009. Das eleições de Abril seguinte saiu um governo de coligação Social-Democrata/Verdes liderado pela senhora Johanna Siguroardóttir com ideias de integrar a Islândia na zona Euro e/ou a própria UE.
Mas aquilo que mais tem chamado a atenção de alguns observadores é o grau de consciência e participação cívica das pessoas comuns, procurando elas próprias intervir organizadamente nas grandes decisões que afectam toda a colectividade e controlando de perto as acções dos seus mandatários eleitorais, bem longe da ideia do “cheque em branco” passado aos políticos. Assim como pressionaram o parlamento a pôr o antigo primeiro-ministro em tribunal por negligência, também já rejeitaram por duas vezes em referendo que o tesouro islandês pague as indemnizações reclamadas por investidores estrangeiros (ingleses e holandeses) nos bancos que faliram, o que, se pode constituir um risco para a necessária confiança financeira internacional, também responde frontalmente àqueles que só buscam ganhos especulativos e gostam de apostar em “operações perigosas”, ignorando as eventuais consequências desses “jogos” sobre a vida de terceiros.
Além disto, os islandeses elegeram também uma comissão de 25 cidadãos sem filiação partidária para proporem os termos de uma revisão da actual Constituição.
Nesta altura, talvez a Islândia já não pense em ligar-se mais estreitamente à Europa ou esteja algo desorientada, à espera de que o ambiente financeiro mundial se clarifique. Mas a atitude activa e participativa de bom número dos seus cidadãos é um garante de que, como povo, serão capazes de superar novas dificuldades, porventura ainda maiores do que aquelas que já conheceram nos últimos anos.
Nestes tempos de motins urbanos na civilizada Inglaterra, de preocupação com as crises da “dívida soberana” de vários países (incluindo os Estados Unidos) e de temor de nova recessão, é bom saber do exemplo de povos que se não deixam facilmente abater.
JF / 13.Ago.2011

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