Para os que já se encontram na recta final das suas vidas e tiveram a sorte de viver os anos 50 e 60 com modesto conforto, há um programa radiofónico semanal que não devem perder. É o “Ilha dos Tesouros”, de Júlio Isidro, que passa aos sábados na RDP-1 à desagradável Hora das 8 às 9 da manhã, e antes de outro bom espaço de memórias, o “A Vida dos Sons” de Ana Aranha e Iolanda Ferreira que prolonga retrospectivamente o excelente televisivo de Joaquim Furtado sobre a guerra em África.
Ali se podem escutar as românticas canções italianas da época, os ritmos latino-americanos em que nos rebolávamos, as músicas faladas (mais do que cantadas) na língua de Molière, fossem de protesto, de doçura ou de paixão, ou ainda os acordes metálicos e as vozes roufenhas made in USA. Além, claro está, dos cantores ligeiros portugueses, como o Tristão da Silva, o Francisco José ou a Maria de Fátima Bravo.
As escolhas – de um arquivo certamente fabuloso – são felicíssimas, as apresentações e comentários de uma graça e elegância raras. Muito progrediu o “menino Julinho da mêpê” desde esses tempos para cá! Júlio Isidro (“Isídrio”, como lhe chamava o Tony Silva no primitivo “Passeio dos Alegres”) – a quem se deve prestar a devida homenagem – foi um comunicador televisivo simpático e engraçado, importante promotor de talentos para o espectáculo de divertimento dos nossos dias e é testemunha viva de toda a produção musical “de massas” deste meio século. Agora revela-se como um guardião de memórias, espirituoso, quase sempre irónico, crítico, mordaz às vezes (e não nostálgico), de todos esses sons que encheram a alma de muitos de nós.
A nostalgia vem da música, não das palavras do apresentador, e muito menos das evocações dos dramas das guerras, dos ambientes claustrofóbicos do salazarismo ou da insuficiência de bens que atingia a maioria.
É uma bela maneira de nos irmos despedindo. Até porque algumas dessas cançonetas ainda nos fazem vibrar. Mas são emoções mansas, como os contos de Natal.
JF / 21.Dez.2012
Gosto de ouvir música italiana, francesa e portuguesa de há 47/50 anos, de quando estava na adolescência e iniciava a minha actividade profissional. Pena que a rádio e a televisão não dêem mais música latina, preferindo muitas vezes a anglo-saxónica.
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