Muita gente pensa agora mal de Fernando Nobre, depois desta sua breve incursão pela vida política. Ela terminou, de facto, de maneira desastrada. Mas um ano de diversão não deve fazer esquecer três décadas de empenho humanitário e plena consagração da AMI a causas sociais que desconhecem fronteiras, obra pela qual lhe devemos estar todos reconhecidos. Não é porém o primeiro que tenta essa translação – a começar pelo seu companheiro animador de Médecins sans frontières Bernard Kouchner.
Já se lhe tinha descortinado alguma ponta de vaidade na referência que sempre fazia à sua inimitável experiência de situações-limite de sofrimento e desespero humano e à autoridade moral que daí retirava. Também o subtil anti-americanismo que transparecia do seu discurso de anos recentes permitia pensar num expediente de facilidade argumentativa, perante a grandeza de certos problemas e a complexidade de os pensar à escala mundial em que, de facto, se colocam. Mas foi com temor (por ele) e cepticismo que o vimos lançar-se na corrida a Belém, suspeitando fortemente que pudesse ser trunfo jogado pelo sector do PS agastado com a candidatura de Alegre, agora apanhado na teia de Sócrates e posto na competição presidencial como representante oficioso do partido fundado por Mário Soares.
Nesse papel de candidato, Fernando Nobre foi um genuíno “amplificador” dos sentimentos largamente difundidos na população que criticam acerbamente o desempenho da “classe política” no seu todo, sem grande distinção entre políticas e posições partidárias – o que, se será um erro para um analista especializado, é uma opinião bem compreensível para a percepção que pode ter da vida pública a generalidade da nosso população. Ideias como a redução substancial do número de deputados (visto o “aprisionamento” destes pela lógica sectária dos partidos), ainda que constitucionalmente impossíveis, caíram com agrado em muita gente desiludida com os partidos mas que ainda não desistiu de procurar caminhos de revivificação democrática. E os tiques populistas-justicialistas do “eu-que-não-sou-como eles” não foram então de molde a crispar senão aqueles que, precisamente, se sentiam atingidos por tais remoques.
Porém, a mesma ingenuidade que o fizera lançar-se na corrida presidencial foi-lhe agora fatal na gestão que procurou fazer do “capital político” dos tais 400 mil votos angariados em Janeiro. Em vez de – à boa maneira republicana – fazer uma excelente declaração política e voltar para casa, para a AMI e as suas causas, aceitou a proposta do novo líder do PSD (também ela misto de ingenuidade com a tradicional “pesca à linha” oportunista dos políticos), sem perceber a reviravolta que estava a dar em relação ao tom da sua recentíssima campanha.
Era agora a vez dessa mesma “classe política” retaliar, mostrando a comum base de interesses próprios que a unifica, face ao país, quando teve a oportunidade de, pelo voto secreto mas precedido de discussões abertas e chamadas-à-ordem feitas pelos líderes, proceder à eleição do novo Presidente da Assembleia da República. Não bastou o penhor da palavra de Passos Coelho, acatada tant bien que mal pelo seu partido: do CDS ao PS, do Bloco de Esquerda ao PCP, foi larga e confirmada a maioria que rejeitou a candidatura de Nobre. Ao fazê-lo, porém, não estavam senão a dar razão ao essencial da mensagem que aquele fizera passar no último Outono – pelo menos tal como a entendeu uma parte significativa do eleitorado.
Resta ainda ao dr. Fernando Nobre uma saída de cena digna, após estes episódios. A de que se retire da actividade partidária, reconheça as suas inabilidades recentes e regresse à sua condição de cidadão, com autoridade própria para formular juízos e opiniões políticas capazes de serem escutadas com interesse e proveito por uma parte considerável dos seus concidadãos.
JF/22.Jun.2011
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Ainda o recente episódio da votação para o segundo representante do Estado Português: Rir quanto baste da hipótese de Fernando Nobre, Candidato a Presidente da Assembleia da República nem sequer ter votado nele próprio. Pior ainda na fotografia da pós-votação. Por ali andava qual patinho feio, triste, abandonado, sem ninguém lhe dar uma "palmada" nas costas, do género «errar é humano». Que teatro do mau absurdo. A diferença entre causas nobres e a politiquice, reside no vazio.
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