Quando as actuais crianças-de-escola forem adultos
maduros, lá para meados do século, Lisboa deverá ter mudado enormemente.
Imaginemo-la um pouco.
Desejando que nenhum abalo sísmico ou atentado possa
vir perturbar a vida da cidade, é provável que os pólos de fervilhamento urbano
e turístico de Belém e da Baixa pombalina continuem a afirmar-se, com a
reabilitação dos edifícios antigos, novos centros de atracção e meios de
transporte relativamente eficientes. Em contrapartida, os bairros tradicionais
(Madragoa, Bica, Bairro Alto, Mouraria, Alfama, Castelo ou Graça) terão
excluído os seus últimos habitantes populares para dar lugar à classe média,
portuguesa e estrangeira. O cosmopolitismo da Baixa e do eixo da Almirantes
Reis acentuou-se, este último cada vez mais orientalizado, com “muitas e
desvairadas gentes”.
Esta alteração do povoamento foi acompanhada de
medidas adicionais de protecção e melhoria do espaço público, da segurança e da
qualidade de vida, com interdição ou limitação rigorosa da circulação automóvel
em perímetros alargados das “zonas históricas”: colinas da Graça, Santana,
Príncipe Real, Campolide, Campo de Ourique: baixas e vales de Chelas, Arroios,
S. Bento e Alcântara. Porém, a faixa ribeirinha foi submetida a intensa pressão
de urbanização construtiva, salvaguardando o património edificado mais
significativo, pondo à vista achados arqueológicos interessantes, mas
levantando torres, escavando estacionamentos e adensando a densidade
populacional (permanente e transitória) deste “casco urbano”. Com o atraso de
algumas décadas em relação ao que se fez no estrangeiro, toda a antiga zona
portuária é hoje um dos espaços mais belos e atractivos da capital.
As “grandes obras” foram retomadas, com capitais
estrangeiros (europeus, americanos, africanos, indianos, japoneses e sempre
chineses) sobretudo para resolver os problemas da circulação urbana: 1)
prolongamentos do Metropolitano do Rato até Alcântara (com o grande “nó” aí
previsto e renovação do comboio de Cascais, ligando-o finalmente à linha de cintura),
de S. Sebastião até Campo de Ourique, de Telheiras à Pontinha e de Odivelas a
Loures, com túnel de articulação à renovada linha ferroviária do Oeste
(Contudo, o revolucionário projecto japonês do “Metro das Colinas”, saindo de
Santa Apolónia, subindo à Graça e Sapadores para passar em viaduto à colina de
Santana e desta, por modo idêntico, ao Príncipe Real, terminando na Estrela ou
em Alcântara, estará ainda em vias de execução, devido a complicações técnicas
e financeiras entretanto surgidas); 2) enterramento do comboio do Cais do Sodré
até Algés; 3) eléctricos rápidos de Alcântara ao Jamor e do Terreiro do Paço ao
Parque das Nações; 3) túnel rodoviário ligando a Av. 24 de Julho à Infante D.
Henrique, para libertar a Praça do Comércio; 4) terceira ponte
(rodo-ferroviária) sobre o Tejo, como estava programada desde o início do
século; 5) e o novo aeroporto em Alcochete.
O esvaziamento do espaço aeroportuário da Portela de
Sacavém (que todavia reteve um heliporto de boas dimensões) permitiu abrigar ali
a nova Gare Ferroviária Central da capital e desenvolver ao máximo a
urbanização na Alta de Lisboa onde, aproveitando a altitude do lugar, uma
enorme torre-miradouro de telecomunicações permite agora aos turistas uma
fabulosa vista de 360º, de Sintra a Cascais, a Palmela e a Santarém. Foi uma
“quarta centralidade” de Lisboa que ali nasceu (depois da Baixa, Belém e Parque
das Nações): onde antes eram quintarolas e depois foram barracas e “bairros
sociais”, vive agora gente da classe média-alta em seguros condomínios fechados
e existem alguns espaços e equipamentos colectivos de boa qualidade. Está mesmo
projectada para ali a “nova ópera de Lisboa” (quando houver um mecenas que
ajude o financiamento).
Entretanto, as populações segregadas para fora da
Lisboa pós-moderna foram-se acumulando nos concelhos de Amadora, Sintra,
Odivelas, Loures e Vila Franca (além, da margem sul), criando problemas que os
respectivos autarcas têm dificuldade em resolver.
Mas a capital portuguesa já ombreia de novo com
outras grandes urbes europeias!
JF /22.Jan.2017
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