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sexta-feira, 30 de dezembro de 2011

Repartir o trabalho, taxar o capital

Estas ideias são todas antigas. No período de grandes crises que se seguiu à Guerra de 1914-18, os anarco-sindicalistas portugueses procuravam distribuir o pouco trabalho existente por todos os trabalhadores, de molde a evitar os despedimentos e a completa falta de recursos para os desempregados sobreviverem. A CGT chegou a falar numa redução do horário para 30 horas semanais, mas, de facto, em alguns sectores (como no vidro, nos transportes marítimos, na metalurgia, na cortiça), os sindicatos lograram diminuir drasticamente o tempo de trabalho – e o correspondente salário – equitativamente entre toda a força-de-trabalho. Em contrapartida, os comunistas de então reclamavam a criação de um subsídio para os sem-trabalho – a que Salazar respondeu com um desconto obrigatório de 2% nos salários para um Fundo de Desemprego que, aliás, só veio a pagar subsídios aos desempregados mais de três décadas depois…
Há poucos anos, falavam certos especialistas europeus nas vantagens de “repartir o trabalho”, nomeadamente através do incremento do trabalho-a-meio-tempo. Na Holanda e outras nações nórdicas, esta modalidade de emprego está significativamente mais difundida no que na generalidade dos países (embora, naturalmente, o nível de salários aí praticado facilite tal opção).
Agora, em plena crise, ninguém parece sugerir soluções deste tipo, muito menos em Portugal. Os que têm trabalho agarram-se a ele, aceitam alongamentos do horário; e os que fazem regularmente “horas suplementares” nem por sombras pensam prescindir desse rendimento extra a que se habituaram. Lamentam os colegas lançados para o desemprego, bramam contra o governo e os ricos, mas: nem sonhar com qualquer modalidade de resistência económica mais equitativa e solidária! No mundo individualista e concorrencial em que vivemos, não espanta que assim aconteça.
É certo que as taxações dos altos rendimentos e das operações financeiras especulativas aparecerão sempre, aos olhos da maioria, como as soluções mais justas e mais óbvias, que não serão mais vigorosamente executadas apenas pelo “conluio existente entre os poderes político e económico”. Há uma certa dose de verdade nesta afirmação, mas o problema mais espinhoso é que, para cada país de per si (e pior se for um país pequeno), os impostos sobre a riqueza financeira afastam imediatamente os capitais e os investimentos produtivos para outras paragens, não apenas por motivos de ganância, mas também pela decisão racional de um gestor financeiro que vai proporcionar a cada um de nós – pequenino aforrador ou depositante bancário – uma remuneração das suas poupanças ligeiramente mais atractiva. Este, um dos dramas da insidiosa economia global actual. Os grandes números fazem o resto.
É, porém, possível que todos tenham uma parte de razão, mesmo pensando apenas no curto prazo. Que, de acordo com a situação de cada sector de actividade e um reexame das prioridades pessoais de cada qual, se possa caminhar para mais frequentes soluções de “partilha do trabalho” e modalidades de part-time. Que, mesmo de forma não-contributiva, não devam faltar a cada pessoa os apoios de sobrevivência mínima, sem que com isso se estimule o ócio ou a delinquência. E que a falada “supervisão financeira internacional”, constrangindo e taxando os movimentos de capitais, permita um aumento significativo da contribuição das classes mais ricas em favor de um desenvolvimento mais equilibrado do conjunto da sociedade.
JF / 30.Dez.2011

1 comentário:

  1. Artigo muito engraçado. Podem explicar-me como é que a Bélgica consegue subsidiar tantos desempregados ha anos e anos? São 900 euros por mês sem fazer nada. Quem me dera !!!

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