Estes são talvez os fenómenos colectivos mais desgraçados a que está sujeita a espécie humana.
Os cataclismos naturais são inevitáveis e fazem parte da nossa condição geo-biológica terrestre. Grandes cheias, tremores-de-terra, erupções vulcânicas, tsunamis ou tufões provocam geralmente enormes estragos e vítimas. Contra isto, é inútil apaziguar os deuses com oferendas. Apenas podemos, hoje, estar alerta e ter planos de prevenção para acudir com os melhores socorros quando tal acontece. Mas tais fenómenos também nos ajudam a situar melhor a nossa existência no universo natural a que pertencemos.
Os acidentes têm uma escala diferente, mais à nossa dimensão individual e ocorrem geralmente por falhas ou descontrolos dos humanos. Numa análise científica do fenómeno, podemos dizer que eles são incompressíveis, isto é, que nunca se podem evitar completamente. Contudo, no plano da responsabilidade pessoal e social, é possível e desejável fazer mais que lograr regredir sempre a sua incidência, através da educação e formação, de uma prevenção passiva e activa, etc. Os valores e as atitudes sociais são aqui determinantes e não vale confiar apenas nos especialistas do assunto nem nos sistemas existentes de reparação dos danos (medicina de reabilitação, seguros, etc.).
As epidemias pareciam estar registadas sobretudo no nosso passado histórico ou nas condições de miséria de populações muito atrasadas. Porém, o derrube de fronteiras nacionais e morais voltaram a trazer-nos novas ameaças deste tipo, da Sida à “doença das vacas loucas”, do Ebola à “gripe das aves”, das estirpes virais resistentes à bactéria E.coli. Estas, são “doenças de civilização”.
Julgar-se-ia igualmente que as fomes seriam eliminadas com os progressos da técnica e o desenvolvimento económico. Embora muito se tenha progredido no mundo, a rarefacção dos sustentáculos agrícolas locais tornou certas populações mais dependentes de trocas externas ou de políticas governamentais. África é ainda um país onde se morre de fome e a subnutrição estigmatiza profundamente certas populações, tal como acontece em algumas regiões da Ásia e mesmo da América Latina. E aqui o dedo acusador deve provavelmente ser apontado ao modelo de desenvolvimento económico e de direcção política que rege a nossa modernidade.
Felizmente, o fenómeno da guerra tem vindo a tornar-se mais raro e breve, depois da última hecatombe do século XX. A guerra é um dos mais antigos fenómenos da história humana e daqueles que mais dramas tem provocado, mas trata-se de um caso em que é fácil identificar agentes responsáveis: são as lideranças políticas e estatais, respectivamente para as guerras civis e entre nações. Há contudo guerras defensivas e justas, mas a maioria delas é desencadeada devido a dinâmicas conflituais lançadas por aquelas elites que, quando não são deliberadas, a certa altura se tornam imparáveis, o que em nada desculpa os seus provocadores.
Sobre as revoluções, um outro fenómeno violento que abriu as portas e marcou a Idade Moderna, têm de fazer-se juízos contraditórios: lastimá-las, pelos sofrimentos que causam e as injustiças que permitem; mas compreendê-las e justificá-las, quando elas constituem a saída inevitável para uma situação de opressão colectiva. Contudo, quando (e enquanto) tal é (ainda) possível, é sempre preferível a “evolução” ou as “reformas”, antes que rebente o dique do sofrimento da maioria ou se incendeiem as achas preparadas pelos incendiários. Até porque as revoluções geram quase sempre reacções violentas opostas, ou contra-revoluções.
Finalmente, no meio de tais convulsões, as crises de natureza económica ou financeira que de tempos a tempos abalam as sociedades contemporâneas até parecem coisas de somenos ou benignas. Na realidade, pelo desemprego e perda de rendimentos que geram, frustração de expectativas, efeitos de marginalização ou de revolta, etc., as crises são fenómenos sérios e graves. Mas também têm virtualidades, quando – sem se chegar a guerras ou a revoluções – se podem rectificar orientações, corrigir erros, mudar processos ou inovar de forma humanamente positiva o que tendia a perpetuar-se. Esperemos que isso aconteça desta vez.
JF / 10.Dez.2011
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