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sábado, 22 de outubro de 2011

Give peace a chance!

“Dêem uma oportunidade à paz!” O apelo parece apropriado no momento em que o ditador Kadafi tombou varado por balas na batalha de Kirte e em que, por casualidade, o que resta da ETA guerrilheira afirma renunciar à luta armada.
No primeiro caso – a supor que esta vitória dos insurrectos apoiados pela NATO dará finalmente ao CNT o controlo militar e de segurança do país –, resta saber se este modo manu militare de abater um regime não vai prolongar-se em campanhas vingativas ou lutas armadas entre tribos ou facções, e se forças radicais islamistas não tentarão apropriar-se de mecanismos importantes de dominação social (educação, solidariedade) ou política (exército, justiça, comunicação), que irão certamente ser agora levantados até com ajuda de dinheiros externos, ou aproveitarão oportunidades futuras para afirmar o posicionamento da Líbia no seu “indefectível apoio à causa palestiniana” ou contra a “ingerência imperialista nos seus assuntos internos”.
Em geral, as revoluções tendem a engendrar processos contra-revolucionários, que podem afundar as sociedades em conflitos intermináveis. As “boas revoluções” são as que encontram uma ampla base de apoio/compreensão social para a remoção do estado-de-coisas anterior, que se eternizara, e que se distinguem pelo uso excepcional da força, de muito curta duração. Neste caso, o facto da iniciativa da revolta (em Bengazi) ter provindo em larga medida do mesmo de tipo de “coligação-de-rua” que protagonizou as mudanças na Tunísia e no Egipto – isto é, jovens de classe média ocidentalizados, quadros dissidentes e povo urbano sofredor –, a discreta ajuda militar e política obtida de França, Inglaterra e Estados Unidos, a circunstância da Líbia ter recursos económicos (petróleo, relevante para os ocidentais) com que pagar os custos económicos da reconstrução e o próprio contexto “progressista-democrático” destas actuais “revoluções árabes” permite alimentar algumas esperanças quanto a uma evolução razoavelmente bem sucedida. Também parece positiva a maneira como a vida urbana tem sido retomada e reorganizada nas cidades sucessivamente ganhas aos “kadafistas”. Mas, é claro que têm razão os analistas que apontam a incógnita de como vai ser possível gerir este processo e construir uma legitimidade democrática para o novo poder onde não existem instituições de Estado que permaneçam (administração pública, justiça, segurança, etc.) e onde as forças políticas partirão do zero. Sairá antes um poder de Estado assente numa negociação com as tribos tradicionais (parecido com o de Karzai no Afeganistão)?
No que toca à nossa vizinha Espanha, o passo agora dado – parece que com o “conselho” dos ex-guerrilheiros irlandeses – significará o fim do “abcesso de fixação serôdio” que constituía este recurso à acção terrorista por parte de nacionalistas bascos, num país que goza de ampla liberdade de expressão e actuação cidadã, bem como de instituições legitimadas pelo voto das populações. Bem entendido, a questão política da integração da nação basca no Estado espanhol vai permanecer – como bem mostra o caso da Catalunha –, porém noutras plataformas e com outras conjunturas e processos. Oxalá a inevitável “resistência” dos mais impetuosos e dos “sacrificados” a esta nova fase seja breve e mínima, para que também cesse, efectivamente, a insuportável “violência de baixa intensidade” dos jovens nacionalistas arruaceiros, corajosamente denunciada por um filósofo libertário como é Fernando Savater.
JF / 22.Out.2011

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