“Anestesiados” com este estio prolongado, aí estão as medidas duras que se já previam para o Orçamento do Estado de 2012!
Como o Estado representa metade da nossa economia e se deixou endividar mais do que podia, agora é toda a sociedade que tem de arcar com os prejuízos.
“Toda”, não é bem assim, pois se no consumo há algumas excepções que aliviam bens alimentares essenciais, despesas de saúde, educação, etc., pareceria justo que o IVA pudesse ser sobrecarregado nos artigos de luxo. Por seu lado, no IRS sabe-se que a maioria dos portugueses nada paga, seja porque os seus rendimentos são muito baixos, seja porque, não sendo assalariados, dele conseguem fugir. E na propriedade e nos negócios há situações excessivamente contrastantes: prédios rústicos ridiculamente taxados devido a um cadastro caduco versus as “artes” e matreirices em que os poderosos são exímios.
Diz já o jornalista económico Nicolau Santos que o fim do 13º e 14º meses é para ficar e para estender ao sector privado (como seria lógico do ponto de vista da equidade e do embaratecimento dos custos do trabalho, mais do que o alongamento do horário), embora isso provoque um rombo na procura interna. As subidas do IVA e das tarifas dos transportes e da energia agravarão a competitividade das empresas e atacam a carteira dos cidadãos, tal como os custos da saúde. Mais créditos particulares (sobretudo na habitação) ficarão por honrar. E não se vislumbra maneira de o emprego voltar a crescer, antes pelo contrário. Perguntar-se-á mesmo até quando os funcionários públicos manterão o seu estatuto protegido. Mas deve reconhecer-se o esforço para que tudo isto só atinja de raspão os dois ou três milhões de pessoas com mais baixos rendimentos.
Em todo o caso, no aumento dos preços e dos impostos, nos cortes aos salários e na recessão da economia, é a sociedade no seu conjunto que empobrece e se torna mais azeda; e é o volume dos declaradamente pobres e assistidos que vai aumentar ainda mais, com o correspondente agravamento do desequilíbrio da segurança social (embora seja questionável que esta seja considerada, por inteiro, uma despesa do Estado).
Simplesmente, é ilusório atirar pedras. Já sabemos hoje demais para que se acredite piamente que a culpa é dos ricos, da banca, dos americanos, da Alemanha ou dos “mercados”. Ou até que culpemos os políticos que “nos roubam” – mas que foram eleitos pela maioria dos cidadãos que se exprimiu nas urnas.
Agora, estando os portugueses na péssima situação em que estão (e os gregos ainda pior), o que também não há dúvidas é que vivemos actualmente uma fase de grande indeterminação no espaço europeu e na economia global. Incertezas nos mercados monetários e financeiros, crises de dívida soberana e de solvabilidades bancárias, tendo como pano de fundo o ascenso de poder económico das novas potências – tudo isso nos pinta um quadro de grande perplexidade. E se em Portugal a situação é de emergência nacional, na Europa, face ao mundo, evidencia-se o desajustamento entre a urgência das decisões económicas e a lentidão e contradições do processo de decisão política da UE. É claro que é quase ofensivo o modo como os líderes da dupla franco-alemã têm tentado avançar. Mas que dizer da coerência de 27 representantes de interesses nacionais distintos sentados à volta da grande mesa do “conselho” ou nas bancadas do parlamento europeu? Poderá a crise actual superar-se com uma maior integração das nações da Europa?
As manifestações de rua de 15 de Outubro, um pouco por todo o mundo desenvolvido, foram aquilo que podiam ser: um protesto, um sinal de dissensão e de desespero das populações jovens e urbanas face a este agravamento das suas perspectivas de vida. Têm boas razões para tal. Como sempre, os organizadores políticos das ditas tentam capitalizar este descontentamento para as suas respectivas ideologias ou objectivos instrumentais. Mas todos sabemos que não dispõem de qualquer solução alternativa e melhor para contrapor a este nosso declínio.
Tentemos ser lúcidos no meio da confusão, e não acrescentá-la.
JF / 16.Out.2011
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João,
ResponderEliminarIsto está tudo muito mal. O terrorista de Direita radical Breivik pôs o assunto como uma Guerra (não interessa quem são os inimigos, porque a maneira de ele «pôr» o assunto, só serve o ritual, dito «renovador», da Guerra). Não seria altura de nos precavermos com mecanismos contra a violência e a perseguição, nomeadamente procurando, mesmo formas alternativas de obviarmos ao nosso dia-a-dia, em Saúde, solidariedade e comida? Não seria altura de reconstituirmos humildemente e em silêncio, a Família humana?