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terça-feira, 12 de julho de 2011

Na Grécia, todos terão razão, mas a sociedade está a afundar-se

Os sindicatos e os funcionários e trabalhadores gregos têm protestado através de sucessivas greves gerais e veementemente nas ruas de Atenas contra os cortes nos salários e nas despesas sociais, os despedimentos e as falências, manifestações a que se juntam desempregados, pensionistas, jovens e donas-de-casa. Muitas vezes, explode a violência urbana, já quase uma tradição desde os anos das revoltas estudantis baseadas no Politécnico e protagonizadas por jovens “oklarkista” (revoltados sem causa), que não se sabe bem se estudam, divertem, são politizados vanguardistas ou já estão perdidos na delinquência ou marginalidade social.
O partido Nova Democracia, de direita, terá exagerado nas manobras contabilísticas para mascarar o estado calamitoso das finanças públicas e foi castigado nas urnas no Outono de 2009. Mas o PASOK, socialista, que se lhe seguiu não conseguiu até agora reverter a situação. A ajuda exterior de há um ano, parecida com a portuguesa, está à beira de se esgotar sem resultados, exigindo-se agora um novo pacote de igual grandeza, mas certamente com exigências mais gravosas e juros mais altos. É que os prestamistas FMI, BCE e UE não têm o dinheiro guardado no cofre, têm de ir pedi-lo emprestado às instituições financeiras detentoras de capitais (por depósitos e investimentos de outras empresas e particulares) – isto é, o tão mistificado “mercado” – as quais, além que quererem ganhar com o empréstimo, sabem bem o risco que correm e fazem-se pagar por isso.
Mas também parece certo que, durante anos e numa conjuntura laxista de crédito fácil, os gregos terão sido muito incentivados a endividarem-se (no consumo, sem base produtiva suficiente; no estado, para a concessão de benesses, Jogos Olímpicos, submarinos e outras larguezas) o que torna também agora os credores (bancos alemães e outros) temerosos de que a ruina helénica acabe por transformar-se em sérios problemas e prejuízos para eles próprios. Daí a base de convicção (ou de mera argumentação) daqueles que propõem a “reestruturação da dívida” em alternativa aos programas de austeridade. No entanto, esta saída parece ilusória, como se fosse possível aos devedores ditarem as regras aos credores ou, noutra postura, menosprezar-se os custos brutais (dizem que durante décadas) de um “default” (“incumprimento”, “descoberto”, palavras doces para insolvência) ou de um retorno à moeda própria, a qual sofreria uma desvalorização em queda livre, receita eficaz para um imediato empobrecimento de países que pouco exportam e muito importam.
As culpas do sistema bancário parecem evidentes (por emprestarem demais, na mira do lucro); as dos mercados financeiros são inerentes a uma economia aberta, mundializada e que a electrónica e as telecomunicações tornaram parcialmente “automática” e “na hora”, sem que haja um poder regulatório suficiente; as atitudes dos mais poderosos que dominam a UE também são apontadas por muitos como traindo os ideais europeístas e estando a ceder cada vez mais aos egoísmos nacionais (o que, noutra perspectiva, pode ser visto como indeclinável responsabilidade democrática perante os seus próprios eleitores); e, finalmente, os cidadãos e as “forças vivas” das diversas sociedades europeias (sindicatos, associações, grupos de interesse, imprensa, elites, etc.) também não ficam isentos de alguns pecadilhos consumistas e predadores.
É provável que a Grécia seja o primeiro “elo fraco” da zona Euro objecto de dinâmicas financeiras imparáveis. Mas também é verdade que a economia grega apostou excessivamente no turismo, tinha uma importante frota mercante mas que todos os marinheiros sabem ter sido sempre das mais desleixadas na conservação do material (a par das bandeiras-de-conveniência do Panamá e da Libéria) e terá criado hábitos de “sol-bebida-e-esplanadas” que os mais novos vieram acrescentar à sua geral propensão para a “expressividade” (no lugar do trabalho), em pleno usufruto das belezas naturais e culturais da sua terra.
Agora, certas minorias manifestam-se mediante depredações e violências, redescobrindo antigas virtudes guerreiras ou parecendo querer voltar ao clima de guerra civil que o país conheceu nos anos 40. Não é um bom caminho, e esperemos que se consiga estancar essa pendência.
Com empobrecimento, divisões e violências, é toda uma sociedade que se vai afundando. A Grécia já conheceu isso quando passou de uma Antiguidade que hoje glorificamos a séculos de submissão e irrelevância. E, nestas condições, as saídas são geralmente desastrosas para as liberdades.
JF / 12.Jul.2011

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