Há umas décadas atrás os Bilhetes de Identidade incluíam uma rubrica designada Sinais Particulares onde as autoridades inscreviam, quando era o caso, observações como: “estrábico”, “coxo da perna esquerda”, “sinal protuberante na testa”, “falta do dedo indicador da mão direita”, “tatuagem no ante-braço esquerdo com inscrição amor de mãe”, etc. Eram marcas corporais indisfarçáveis, às vezes marcas penalizantes da natureza, mas que sempre podiam servir para a identificação (e a acusação) de um suspeito de qualquer crime ou delito.
Porque todos procuramos fugir à estigmatização social, era sempre com alívio quando víamos que o burocrata de serviço tinha aposto em tal rubrica do nosso BI um “Nada” ou um mero rabisco a tinta vermelha. E considerávamos geralmente uma parvoíce ou estupidez aquelas figuras bizarras de marítimos ou de blobe-trotters que faziam gala em tatuar um pedaço da sua pele.
Hoje, milhares de jovens (e de menos jovens) bricam visualmente com a superfície do seu corpo como se fosse papel-cenário, que se pinta e deita fora. Nem lhes passa pela cabeça que se estejam a desrespeitar a si próprios! É apenas giro, nice. A mim, ocorrem-me as gravações de identificação que os nazis faziam nos braços dos seus detidos em campos de concentração, e sinto náuseas. Oferecer voluntariamente marcas corporais que nos identificam irrecusável e definitivamente perante uma qualquer polícia impiedosa, um ‘big brother’? Sem nos dar sequer a oportunidade de explicarmos que se trata de um equívoco, de uma troca de nomes? Só de loucos! É, contudo, a prova de que, para o melhor e para o pior, vivemos hoje num verdadeiro “reino da liberdade”, onde as pessoas já não temem ser identificadas nem se sentem estigmatizadas por alguma conspícua marca corporal.
Mas, se calhar, perante a avalancha do fenómeno, já nem hoje as polícias (criminais ou políticas) olham muito para os Sinais Particulares dos suspeitos. (A propósito, será que os comandos da PSP aceitam que os seus agentes se tatuem?)
JF / 12.Set.2010
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domingo, 12 de setembro de 2010
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