Hoje, 5 de Outubro, soube-se que António Guterres
será o próximo secretário-geral da ONU. É uma rara distinção, que o próprio fez
por merecer e que gratifica também o nosso país, no seu conjunto. Neste caso –
tal como em 1999 por causa da independência de Timor-Leste, quando o mesmo
Guterres era primeiro-ministro de Portugal e teve nesse processo uma
intervenção decisiva –, o país soube unir-se, superando as suas divisões
internas: então, com assinalável participação popular e o envolvimento da
Igreja Católica; agora, com uma boa conjugação de esforços de todos os agentes
políticos (e certamente com uma acção preponderante de Belém).
Como político do PS, o engº António Guterres foi um
parlamentar aguerrido que alguns acusaram de “tirar o tapete” ao seu líder Jorge
Sampaio. Era visto como “apaixonado pela educação” e sempre “aberto ao diálogo”,
mostrando como governante (sem maioria na Assembleia) alguma dificuldade em
tomar decisões difíceis. Por exemplo, deixou progredir o “facilitismo” na
educação, entregou o processo de adesão ao Euro a Sousa Franco e das obras
públicas a João Cravinho, limitando-se a “cumprir calendário” no êxito mitigado
que foi a “Expo-98”. Nessa época, foi vencido duas vezes pela matreirice política
de Rebelo de Sousa, líder do PSD, ao perder os referendos que aceitou (sobre a regionalização
e o aborto). E deixou o país estupefacto e incrédulo quando abandonou o governo
em 2002 após derrota em autárquicas “porque não queria deixar o país num
pântano”, ninguém percebendo completamente o alcance desta tirada.
Depois, afastou-se realmente da cena política
portuguesa. Católico praticante, Guterres mostrou grande emprenho e sensibilidade
aos problemas humanitários enquanto alto-comissário da ONU para os refugiados,
apesar dos escassos meios de que dispôs. Mas não terá conseguido corrigir as
recorrentes acusações de mau desempenho de algumas ONG e de outros
intermediários no encaminhamento de socorros aos verdadeiramente necessitados.
E foi incapaz de começar a reverter a situação de alguns campos de refugiados
instalados há várias décadas, com o sustento e sob a protecção das Nações
Unidas, mas onde se diz que agentes políticos radicais actuam à vontade na
catequização dessas populações fragilizadas e recrutam combatentes para as suas
organizações. Mas esses eram desígnios que certamente estariam para além de
onde a sua actuação poderia alcançar.
Agora, o lugar de secretário-geral da ONU é ainda
mais espinhoso e de maior responsabilidade. Há, desde logo, os teatros de
guerra, com êxodo de populações, que seria mister travar. Há a reforma do
Conselho de Segurança, eternamente adiada. E há o funcionalismo da organização,
sobre o qual existem queixas de ineficiência e despesismo. Veremos o que o novo
rosto da ONU será capaz de fazer. Boa sorte!
E viva a República!
JF / 5.Out.2016
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