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sexta-feira, 4 de maio de 2012
Restos de um fascismo vulgar
Recordo-me bem, em Maio de 1974, de um motorista de táxi indignado com os panos vermelhos “dos russos” que começavam a preencher Lisboa, nas manifestações, edifícios e cartazes, e que assim ofendiam “a nossa bandeira”.
Passaram muitos anos mas tornou-se habitual nestes prestimosos trabalhadores (mas nem sempre bem-educados) a locução de frases de tacteamento, de afirmação ou de provocação, dirigidas ao cliente, contra “estes bandidos” [do governo, ou dos partidos, conforme o vento].
Não por acaso, resultou Salazar na personalidade portuguesa mais votada num desses concursos televisivos de massas em que as pessoas projectam as suas mais indizíveis carências e confusas auto-afirmações.
E o mesmo modelo de endeusamento se repete, em escala reduzida, com a incondicional adesão a líderes “saídos do povo” como o nosso actual Residente em Belém, os Berlusconi das Têvês e dos futebóis ou os “Sassá Mutemas” terceiro-mundistas.
Nas trocas momentâneas que ocorrem entre pessoas desconhecidas, nos transportes, ao balcão do café ou numa fila de espera, são hoje frequentes as expressões (simultaneamente de ignorância e ressentimento) contra os supostos responsáveis ou aproveitadores das suas dificuldades presentes: “cambada de gatunos…”. Porém, os mesmos estão quase sempre à beira de admirar (e invejar) os “espertalhões” do sucesso financeiro rápido e inegável: “Ele está lá. O que é preciso é saber como ir buscá-lo!”
Embora muito mais raramente, ainda o cidadão comum se arrisca hoje a ter que enfrentar o pequeno abuso de poder exercido pelo funcionário do balcão de atendimento ou o agente policial, já não na forma tradicional do “ordens são ordens” mas com a invocação papagueada da letra de um qualquer regulamento que naturalmente desconhecemos.
Mas os grupos de cabeças rapadas que bradam ou cantam slogans clubistas ou nacional-xenófobos, encandeados por algumas imagens de força e demonização do outro, são talvez a face mais visível do inconsciente predador que habita muitos de nós, especialmente na fase de juventude, e se pode manifestar de diversas maneiras.
Oxalá todos estes sintomas não venham qualquer dia a engrossar numa onda avassaladora, também soprada por aprendizes-de-feiticeiro e partidários do quanto-pior-melhor. Pode então ser tarde demais para evitar um retrocesso.
JF / 4.Mai.2012
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Não me posso recordar do Maio de 74, apenas e só pela razão óbvia de ainda não existir, pelo menos da forma como actualmente me conheço, mas não podia ficar indiferente a este alerta, que me preocupa e inquieta, apesar de na maioria do tempo deixar passar sem nada fazer ou até mesmo reflectir.
ResponderEliminarA ideia de que estas "pequenas" e esporádicas imagens, podem vir a transformar-se numa "onda avassaladora" é assustadora e merece a nossa atenção e sentido de alerta.
João, uma vez mais obrigado por me fazer pensar e reflectir em todos estes "detalhes"...