Há um século, a Monarquia aprestava-se a sair de cena, e a República a ser proclamada em Lisboa, com entusiasmo popular semelhante ao do 25 de Abril de 1974.
Entre as forças sociais que aplaudiam ou observavam esperançosas o desempenho do novo regime encontrava-se o movimento operário, essencialmente consubstanciado num sindicalismo de acção vigorosa no seu campo de luta e afirmação próprio: directamente contra o patronato, através da greve e da solidariedade entre “irmãos de classe”; alheando-se da política e olhando as instituições estatais com reserva ou hostilidade; e confiando que não estaria longe a “aurora redentora” de uma grande transformação do mundo, operada no campo social, que pusesse a economia ao serviço de todos, abolisse as guerras e dispensasse os profissionais do uso da violência e do poder.
Tais esperanças vieram rapidamente a revelar-se ilusórias – tanto no plano doméstico como internacionalmente – mas a força e genuinidade desse movimento merece ainda hoje ser recordada, sobretudo para assinalar como, na prática, os ideais da República foram incapazes de responder aos anseios desse povo laborioso das oficinas, das fábricas e dos campos.
Mais do que lutar por condições de trabalho e de vida melhoradas, essa gente aspirava a uma superação do seu estatuto secundário e subordinado na vida social do Portugal de então. Eram os porta-vozes de reivindicações seculares de dignidade humana. Por isso, o movimento operário de inspiração anarco-sindicalista de então não apenas punha na ordem do dia problemas concretos de ordem laboral – melhoria de salários, redução da duração do trabalho, etc. – como, sobretudo, exprimia a questão social dessa época: não mais “amos e escravos”, “não mais deveres sem direitos, nem direitos sem deveres”. Uma boa mensagem.
João Freire
(texto solicitado pelo Jornal de Notícias para sair a 1/5/2010, mas não publicado, certamente por chegada tardia)
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